Ato terrorista do aparelho de repressão pretendia bombardear show com milhares de pessoas
É realmente de estarrecer que exista ainda alguma pessoa neste país se prestando ao ridículo de pedir a “volta da ditadura militar”.
Vou apelar para o clichê, citando um ditado do escritor Edmund Burke (1729 – 1797), advogado e filósofo irlandês: “Um povo que não conhece sua história está condenado a repetí-la”. A frase também é atribuída a Che Guevara.
Missão 115 vem juntar-se a uma leva de documentários estarrecedores que falam das mazelas, da injustiça, violência, sadismo e absurdo que foi a ditadura militar no Brasil.
O filme, em cartaz na plataforma Now, estreou no Festival É Tudo Verdade, em 2018. Dirigido por Silvio Da-Rin mostra o inexplicável atentado no Riocentro, em 1981.
Este é o primeiro documentário sobre atos terroristas do grupo contrário à redemocratização no Brasil nos anos 80.
Nessa época já estava em curso o processo de redemocratização com a Anistia e o vislumbre do retorno de um presidente civil. A ideia era promover uma “abertura lenta, gradual e segura”, segundo o então chefe da Casa Civil, General Golbery do Couto e Silva.
O General Figueiredo, último presidente do ciclo militar desde o golpe de 1964, estava engajado na abertura, mas um grupo de radicais, formados por servidores do aparelho de informação e segurança, apelou para o terrorismo, com medo de perder as regalias.
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Dizem que Deus é brasileiro e o caso do Riocentro comprova. Uma dupla de militares pretendia explodir não uma, mas várias bombas num show de comemoração de Primeiro de Maio no Riocentro. No entanto, e comprovando a interferência divina, uma bomba explodiu antes de ser usada, dentro do carro dos militares, um Puma. Um deles saiu ileso e está vivo até hoje, o outro morreu na hora.
O documentário mostra o que foi evitado: um verdadeiro banho de sangue onde milhares de pessoas seriam atingidas e não poderiam fugir ou serem atendidas por serviços de emergência, porque a segurança do local estava comprometida e todas as portas de saída estavam fechadas.
Missão 115 era o nome que o DOI-CODI atribuiu a essa “operação de vigilância” no Riocentro. O filme não se esgota no relato do atentado e mostra como essa semente de ignorância e fascismo persiste até hoje.
Um dos relatos mais estarrecedores é o do ex-policial e pastor Claudio Guerra, que conta com riqueza de detalhes como o atentado foi planejado e executado.
O filme traz ainda imagens de época, trechos do show no Riocentro e entrevistas com vinte personalidades atuantes naquele período como o jornalista Hélio Fernandes, a advogada Rosa Cardoso, o cientista social Luiz Werneck Viana e os jornalistas Lucas Figueiredo e Chico Otávio.
Silvio Da-Rin, diretor do filme, foi preso político nos anos 1960 e 70.
Diversas matérias na imprensa mostram o atentado do Riocentro, mas este é o primeiro filme que vai a fundo no caso.
A Comissão Nacional da Verdade tem elucidado muitos enigmas e mostrado a verdadeira história do regime militar, apesar da dificuldade de juntar documentos dos órgãos de segurança.
Missão 115 é imperdível.