(entrevista realizada em 08/09/2005)
O DJ e produtor Tiga tem sido um dos mais esperados no Brasil no momento. No entanto até agora poucos conseguiram vê-lo. Ele esteve aqui para festas fechadas em S.Paulo e no Rio de Janeiro, em 2004. Este fim de semana ele se apresenta na festa Electronic Dream Team, em S.Paulo na sexta e no sábado em Brasília, no Brasília Music Festival Mix.
Tiga é um daqueles DJs polivalentes que já esteve envolvido em todas as questões da cena dance. No início dos anos 90, em Montreal, sua cidade natal, foi embaixador da cena dance por lá, atuando como DJ, promotor de festas, designer de flyers e produtor. Organizou todo tipo de evento dance, como as grandes raves Solstice (1992), que produziu como integrante do grupo Bus Company. Continuou promovendo festas e eventos até 1994, quando abriu seu próprio clube, o Sona e uma loja de discos, a DNA, além de mantér um programa na rádio CKUT FM. Desde 1998 Tiga também administra um selo, o Turbo Recordings, que lança música de gente como Jesper Dahlback, Lafleche, ADNY e Jori Hulkkonen, entre muitos outros, além de suas própras músicas e de seu projeto especial de produção, o TGV, em parceria com Mateo Murphy.
Foi a grande onda do electro e a volta do estilo anos 80 que elevou Tiga à condição de DJ estelar. Uma de suas produções mais conhecidas, uma versão do hit oitentista Sunglasses at Night, do artista canadense Corey Hart, virou uma espécie de hino da era electroclash do início do século XXI. A faixa está incluída no CD American Gigolo, uma compilação de músicas do selo alemão Gigolo Records. Pleasure From The Bass é outra de suas faixas mais conhecidas ao lado de remixes para Martini Bros., Alpinestars, Linda Lamb, Crossover, FC Kahuna, Cabaret Voltaire, Telepopmusik, Felix da Housecat, Fischerspooner e o rapper Nelly’s (Hot in Herre).
Um clássico recente de Tiga é o remix de Comfortably Numb, a recriação dos Scissor Sisters para a música do Pink Floyd. Outro remix recente é E Talking do Soulwax e é com esse mesmo grupo e mais Jake Shears, dos Scissor Sisters, que Tiga vai lançar no próximo mês um novo single, You Gonna Want Me.
Tiga conversou com o Bitsmag e falou sobre o dilema de tocar para grandes platéias, sobre a onda do retorno dos anos 80 que parece não morrer e sobre os sons que têm estado mais presentes em seus sets.
Bitsmag: Eu fui à festa que vc tocou no ano passado, aqui no Rio…
DJ Tiga: Aquela coisa da Ferrari?
Bitsmag: Sim…
DJ Tiga: Foi uma coisa tipo corporativa, sabe?
Bitsmag: Completamente corporativa.
DJ Tiga: Sim, foi estranho pra mim porque eu estava esperando uma coisa “brasil” e não foi muito por aí.
Bitsmag: Mas você foi ao jogo de futebol antes da festa.
DJ Tiga: Sim, fui a um jogo no Maracanã, claro.
Bitsmag: Então você viu um pouco do Brasil de verdade.
DJ Tiga: Sim, claro. Me diverti muito no Rio, amei. Adoro a cidade.
Bitsmag: Sobre a cena de dance music em Montreal, como está no momento?
DJ Tiga: Acho que está indo muito bem, não tenho estado presente ultimamente. Viajo muito e quando estou em casa trabalho no estúdio, então não estou 100% ao par da vida noturna por aqui. Mas vai bem, sempre foi uma grande cena com muitos clubes e after-hours, é uma cidade de muita diversão. Ultimamente tem sido bom, nos últimos dois anos tem se formado uma nova geração, um pouco de electro, um pouco de house, em uma nova energia. Está legal.
Bitsmag: A cena rola mais em clubes pequenos e underground, como em N.York ou ainda acontecem grandes eventos e festas como as que você promovia no começo de sua carreira?
DJ Tiga: Em lugares pequenos e mais ainda em lugares médios. Mas os eventos grandes, quando acontecem, são bem comerciais e voltados para gente bem jovem. Não são muito importantes. As coisas interessantes estão acontecendo em clubes pequenos.
Bitsmag: Sobre esta volta dos anos 80 pelo mundo todo, aqui no Brasil vemos um fenômeno onde há muita mistura. Bandas bem comerciais da época e que fizeram sucesso repentino e sumiram, agora voltam e são tocadas nas festas ou se apresentam ao vivo ao lado do que havia de mais underground na década. O que vc acha disso?
DJ Tiga: Isso acontece pelo mundo todo, os anos 80 viraram uma coisa da moda. Muito daquilo era bom e muito era ruim. Para muita gente se tornou uma licença pra tocar músicas ruins da época, no meio dos sets. Se pode dizer que é irônico e tudo mas acho que essa onda toda está meio chata agora. Eu realmente acho que não é uma coisa interessante no momento. No começo, 3 anos atrás, 5 anos atrás, acho que foi bem interessante porque todo mundo estava familiarizado com a idéia de ir a um clube e escutar techno a noite toda. Era bem minimal, meio chato. Então nesse momento a idéia de colocar músicas com vocais e melodias e aquele sentimento dos anos 80, rolando no meio da noite ficava empolgante. Acho que essa empolgação está sumindo agora. No fundo a coisa tem de ser feita de forma apropriada.
Bitsmag: O electro trouxe de volta o ecletismo na electronica. Você acha que a cena de dance music vai voltar às segmentações?
DJ Tiga: Não sei. É difícil pra mim responder a uma pergunta sobre as “cenas”, porque não penso nesses termos. Eu costumava ter minhas teorias sobre o assunto, mas ao passo que você se envolve mais com sua própria música você passa a pensar mais em faixas e músicas ao invés de idéias. Não tenho mais uma visão muito ampla sobre o assunto. Mas acho que a coisa não ficará mais tão fragmentada como era antes. Eu acho que essa época acabou, o tempo em que as coisas rolavam em pequenas cenas muito fechadas… Isso sempre vai rolar numa escala pequena, em grupos underground que gostam apenas de underground techno ou apenas de broken beat, etc. Mas isso tudo pra mim pessoalmente não tem mais grande efeito.
Bitsmag: Que novos estilos de electronica você tem tocado ultimamente?
DJ Tiga: Na verdade tenho tocado muito breakbeat, o que é meio estranho. Um estilo que nem é electro, mais pro hip hop, não tão lento como o hip hop. É um hip hop rápido. Não sei exatamente como rotular isso. Um pouco disso começou com o electro, mas agora é uma vibe mais suja, funky e cheia de breaks em relação ao material anterior 4×4. Disco nunca morreu nos meus sets e, bem, pode parecer estranho, mas tem também um pouco de trance na música que tenho tocado. Não o trance tipo progressivo, do estilo de Sasha e Digweed, mas algo com um elemento psicodélico.
Bitsmag: Você acha que todo DJ deveria se aventurar na produção?
DJ Tiga: Sim, acho. Por um lado é divertido e por outro acho que você deve sempre tentar se superar e tentar novas diretrizes. Para muitos DJs é uma coisa bem fácil e alguns provavelmente não se dão conta como é fácil produzir. É bom inclusive para melhorar seu set, você pega idéias simples e cria faixas bem simples e toca no meio do seu set. Acho que torna a coisa toda mais interessante. Dá mais personalidade. Depende, acho que todo mundo deveria tentar, mas só posso falar por mim mesmo: eu ficaria entediado se estivesse apenas discotecando.
Bitsmag: Quais novos artistas vocês estarão lançando no seu selo Turbo Records?
DJ Tiga: Temos uma faixa nova do suisso Plastique de Rêve, temos novidades de ADJD, de Alexi Delano e Jesper Dahlbäck. Temos novidades de Zdar, que é o cara do Cassius. E teremos um novo do TGV, que sou eu e Mateo Murphy. Temos outros ainda, mas não posso te falar.
Bitsmag: Esta pergunta tem a ver com o que aconteceu com você na festa que tocou no Rio no ano passado. Uma coisa é quando o DJ toca para uma plateia que conhece seu som. Bem diferente é quando ele toca pra uma platéia que não conhece e não entende seus set. O que você faz quando isso acontece?
DJ Tiga: Meu Deus… Essa é uma pergunta boa, interessante, porque é algo com o qual tenho lidado muito ultimamente. Eu tenho muitas faixas conhecidas e isso gera uma expectativa, meu trabalho tem tido muito procura. Então toco em grandes eventos e os agentes tentam conseguir grandes cachês. A coisa toda é bem “business”. Eu costumava tocar em clubes e em lugares pequenos e underground. Então a coisa ficou grande e tem negócios envolvidos, pois há uma demanda e você acaba tocando em festas e eventos grandes e obviamente estes às vezes são festivais, às vezes são eventos corporativos com platéias ídem. Quando uma situação dessas acontece eu tento tocar as faixas “grandes” e mais apropriadas para grandes platéias. Quando digo faixas “grandes” quero dizer músicas mais “encorpadas”, com mais energia. Não sei, é um pouco problemático pra mim porque não gosto e acabo ficando um pouco deprimido. Alguns DJs como Paul Van Dyk e Carl Cox estão muito acontumados a tocar para grandes platéias e eles não se importam em tocar somente hits. Pra mim é difícil porque a música que quero tocar é planejada para platéias pequenas. Uma coisa que notei é que muito das músicas que eu gosto, mesmo sendo underground, é acessível. Tem algo nela que o povo em geral gosta. Não é uma música difícil, o que é importante. Então mesmo que eu toque um material underground, não se trata de experimentações estranhas. Meus sets têm muitos vocais, mesmo que não conheçam as músicas, as pessoas acham fácil de entender e de gostar.
Bitsmag: O que você espera de suas apresentações em Brasília e em S.Paulo este fim de semana?
DJ Tiga: Eu tenho grandes expectativas, porque adoro o Brasil. Adoro o povo, eu jogo futebol e jogo com brasileiros. Adoro como jogam futebol. Adoro tudo sobre o Brasil, do que eu já vi anteriormente, as pessoas que conheci ao redor do mundo. Felizes, energéticos, com uma ótima vibração. Por causa disso tudo acho que vão ser ótimas festas. Espero que desta vez seja mais a minha platéia, mais pessoas que me conheçam e conheçam minha música e gostaria que fosse mais quente que das outras vezes. Mais pessoal, menos frio.
Bitsmag: Você vinha tocar no Rio esta semana…
DJ Tiga: Pois é, a festa acabou não rolando, portanto vou a Brasília e S.Paulo e logo depois volto pra casa.
Bitsmag: Espero que você venha ao Rio em breve.
DJ Tiga: Eu vou, prometo voltar. Neste momento sobre a mesa da minha cozinha está um cinzeiro com “I Love Rio” estampado… Voltarei, prometo.