Natureza Obscura na Choque Cultural


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Confira a nova exposição de Mariana Martins

Está em cartaz na galeria Choque Cultural, em São Paulo, a nova exposição da artista Mariana Martins. É uma mostra de dioramas onde Mariana registra cenas do universo prosaico através dos suportes prediletos da artista: colagem e assemblagem. 

Natureza Obscura revela o mundo particular de Mariana, repleto de objetos que remontam a diferentes épocas e diferentes circunstâncias e que aqui vem procurar um novo significado, em novos agrupamentos.

Natureza Obscura – Exposição de Mariana Martins
Galeria Choque Cultural
Alameda Sarutaiá, 206, Jardim Paulista, São Paulo
De terça a sexta, das 11h às 18h. Sábados, das 11h às 18h
Grátis

Confira aqui texto da curadora Lui Carolina:

Na noite escura do ser, no dentro de cada ser, existe uma natureza selvagem. Um lugar não habitado e sequer ainda explorado. Esse lugar secreto e também maravilhoso é da ordem do obscuro. Obscuro no sentido de desalumiado, incógnito e totalmente desconhecido.
Adentrar a natureza obscura do ser, exige o mesmo cuidado de quem embrenha pela primeira vez em mata virgem. Em ambiente selvático. Em território desabitado. Em zonas abissais. E ao mesmo tempo, a mesma delicadeza de quem contempla algo pela primeira vez. Porque nesse lugar de obscuridade do ser está toda sua intimidade ainda não revelada.
O sonho, às vezes um gesto, um dito ao acaso, uma aparição no tempo que o tempo logo torna pretérito e a obra de arte revelam um tanto desse mundo particular. Então, nesses raros momentos é preciso alumiar com o olhar de dentro e quiçá com os demais sentidos, o que estava até então oculto.
É demorar-se nessas coisas. Coisas tão passageiras. Coisas tão sutis. E como se demorando-se nelas, fosse possível captar o que ainda não existe no mundo real. Uma tentativa de compreender o mundo particular de cada ser, no qual cada um, cada um de nós coleciona arcanos desde a primeira infância.
Tantas coisas e coisas tantas que, se trazidas à tona, seriam como uma espécie de assemblagem de diversos fragmentos de vida, que revelariam um pouco do que há no dentro de nós. No mais secreto de nós. E talvez, o que é o mais de nós mesmos.
O colecionismo faz parte da biografia de Mariana Martins, que desde sempre recolhe objetos do mundo real e também do seu de dentro. A colagem resulta na obra. Uma técnica, não no sentido de arte ou artesania, mas no sentido primevo de “deixar-aparecer”.
Os gregos antigos usavam o verbo tikto, cuja raiz é tec, para expressar a ideia de mostrar a essência da produção, como em tékne, técnica, em português. De modo que técnica quer dizer em primeira instância “deixar-aparecer”, fazer surgir, desocultar uma essência, desvendar, desvelar o de dentro.
No de dentro do ser da artista Mariana Martins há um mundo particular muito peculiar e que está revelado nos dioramas. Curioso, então, pensar que no próprio termo diorama – palavra formada a partir do prefixo grego “di”, que significa através e “hórama”, também do grego, que quer dizer “o descortinar do espetáculo” e/ou “a vista do todo” – está contemplado o  uso da técnica para revelar o dentro do ser.
De modo que esse ser de dentro de Mariana Martins descortina um espetáculo em miniatura: resgatando elos perdidos, promovendo diálogos impossíveis, criando balés improváveis e  realizando composições apocalípticas. É um espírito que abarca uma espécie de gabinete de curiosidades em que as antinomias fazem a construção de um novo mundo possível.
Um mundo em que mesmo na normalidade presente nos dioramas mais realistas, de realismo puro, sem qualquer tipo de elemento caricatural, há uma ordem que esconde outra ordem. Uma ordem invisível aos olhos. Algo incomodo, quer seja pela sua preeminente transformação, quer seja pela sua insólita consumação prestes a devir.
A lagarta é um elemento quase sempre presente,  símbolo da transformação e também do esgotamento, dada sua índole faminta, que a tudo consome para transformar-se noutro ente. O pequeno inseto está em uma vida normal, no american dream, na cena do universo prosaico, no sentimento de melancolia e também no lugar mais onírico do mundo particular de Mariana Martins.
O diorama foi criado por Louis Daguerre (França, 1787-1851), inventor também do daguerreótipo e da câmara obscura. As três criações de Daguerre têm em comum a caixa preta. Nela, a realidade é tomada e transformada em imagem. Uma novidade. Uma transformação sempre presente. A imagem da imagem. Mas, também, de certo modo, a realidade consumida pela sua própria imagem.
A recriação do que se vê, a transformação dos objetos, o eterno jogo simbólico de trazer luz, sentidos e a construção de pensamento, nada mais é do que o habitar as coisas, a natureza, o que construímos e, de certo modo a nós mesmos. Por isso, não tenha medo e habite o particular mundo secreto de Mariana Martins.
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