Aquele que foi o porão mais cultuado dos anos 80 no Rio, palco de experimentações estéticas, depositário de novas tendências, showcase de excessos… O Crepúsculo de Cubatão, casa noturna carioca que surgiu por volta de novembro de 1984, já começa a receber homenagens por conta do aniversário de 20 anos.
Quem viveu sabe, quem não presenciou cultua, sem muita idéia do clima transgressor do clube criado pela vontade de mostrar um som que não tocava nos palcos e rádios do Brasil ainda na época da ditadura. Bom lembrar que em 1984 ainda se fazia passeata pelas eleições diretas, Xuxa era somente a namorada do Pelé e foi vaiada por 1 milhão de pessoas que se amontoaram na Presidente Vargas clamando pela democracia, no histórico comício “Diretas Já”.
Em 1984 havia um movimento punk-new wave que ainda não tinha estourado na mídia. No Rio o Circo Voador já germinava o Rock Brasil de Barão Vermelho, Blitz e Lobão e em Brasília fervia o punk que daria ao país Legião Urbana, Plebe Rude e Capital Inicial. E São Paulo também dava as caras no cenário musical com outras boas bandas punk como Ira!, Inocentes e Ratos de Porão e com o new wave dos Titãs.
Fora do Brasil os movimentos musicais se multiplicavam: o fim do punk dava início à new wave que abrigava góticos, new romantics e synth-pop. Nada disso era mostrado nas pistas brasileiras na época das danceterias. O Crepúsculo de Cubatão no Rio e o Madame Satã em São Paulo eram lugares que preenchiam a lacuna dos que queriam ouvir música nova e experimentar novas tendências de comportamento naquela que foi a década mais visual do pop até então.
E no Rio uma turma de agitadores, sempre num clima londrino bastante discutível para temperaturas na casa do 35 graus, vestia-se de sobretudos pesados, usava maquiagem, e escrachava nos excessos estéticos e às vezes lisérgicos. Era tudo preto no Cubatão e as pessoas dançavam viradas pra parede e as meninas podiam ir ao clube sozinhas, sem se preocupar com playboys assediando.
Nas picapes o residente Luis Claudio De Gang (DJ Ambient), vestido muitas vezes com as criações do irmão, o designer Marcelo De Gang, com muito delineador preto, diga-se de passagem. Dudu Candelot, hoje também residente do Galeria Café, era habituê e DJ da casa bem como Paulo Futura, sim, o DJ de funk, que introduziu nas pistas cariocas o rap de bandas como Run D.M.C. e Beastie Boys.
Força no make e no modelito, que vinha de grifes diferentes como Liquidificadoidos ou da Mr.Wonderful. Nos cantos mais absurdos do espaço, pocket shows de bandas como o Congo, do DJ Edinho ou do Felix Culpa do hoje produtor de moda Rogério S. Muitos ainda serão os relatos das loucas noites onde se ouviu muito o gótico de Siouxie and the Banshees, o rock engajado do The Clash, e o pop “cabeça” de Pretenders, The Smiths, Echo and the Bunnymen e The Cure e onde se cultuavam os primeiros videoclipes da MTV americana, recém lançada nos Estados Unidos…
O Crepúsculo na verdade nunca acabou. Ele foi se desenvolvendo e se metamorfoseando… Depois de muito tempo apostando no dark e no gótico a casa fechou e reabriu num clima mais alegre, dando espaço para a emergente cultura clubber que surgia no hemisfério norte. Assim surgiu o Kitschnete e depois e Smith, que foi fundada por ex-frequentadores do Crepúsculo/Kitschnete e as festas pagas, enfim, a todo o movimento das pistas de dança, uma mídia efetiva do que é verdadeiro na música e no comportamento.
E vive a lenda!